às mulheres: o silêncio.
Coisa comum é ver garota tímida. "Essa menina é tímida demais, é sem graça", eles dizem, como se a criança, por não dizer, não entendesse. "o gato comeu sua língua?" pergunta quase nostálgica… Meninas tímidas, criadas do patriarcado, criadas pelo patriarcal. Toda mulher carrega em si o silêncio. Toda mulher, no fundo, não aprendeu a falar. Eles ensinam o alfabeto, mas, não a falar. Muitas das mulheres que outras mulheres admiram carregam segredos, medos, palavras que nunca foram ditas a si mesmas, a ninguém. E tem aquelas, traumatizadas com os gatos que comem línguas, que acreditam que aprenderam a falar. Elas falam muito. Elas batem no peito, seguras, cheias de si. Elas dizem "se homem meu me trair, eu acabo com ele", mas não tratam a doença que as corrói por dentro, sexualmente transmissível, de um casamento dito sexualmente fechado, de uma mulher quase virgem que, apesar de faladeira, só amou um homem, que ela diz que nunca a traiu. Essa fala, talvez pior que o silêncio, esconde um abismo maior, esconde a negação absurda ao fato de que nós não sabemos falar. Ninguém nos ensinou… Ninguém me ensinou. O silêncio era o meu lar. Aprendi a falar muito tarde, com mais de vinte: uma mulher, uma vez, saiu de uma página, vinda de um papel, um papel que foi escrito por outra mulher que também aprendera a falar muito tarde. Essa mulher-escrita era linda, potente, natural, rasgada… Como só mulheres podem ser. Ela fechou meus olhos, pedindo que eu parasse de ler, que descansasse as minhas vistas…. Se aproximou do meu ouvido e sussurrou no meu cérebro: revolução.
Estou fazendo um trabalho lento de resgate da minha própria escrita. Tenho muita coisa escrita, rascunhada, teoria, pensamento e poesia, que nunca publiquei. Decidi tirar essas coisas da gaveta e publica-las, aos poucos, sem revisar e sem ordem. Será assim ou não será, porque, por virginiana demais que sou, é capaz de revisar para sempre e nunca publicar. Portanto aqui estou.
Esse é um pequeno escrito poético.
Lara Marinho — professora, historiadora, mestranda e estudante. Um pouco de tudo e quase nada.